A cada ção do Informe Epidemiológico sobre Microcefalia, do Ministério da Saúde (MS), quedo-me à impotência diante dos números. Os casos suspeitos só aumentam. Nem sequer temos a dimensão, nem como estimá-la, do que nos espera num país continental como o Brasil, onde a subnotificação é a regra!
Por Fátima Oliveira Do O Tempo
“Até 5 de dezembro de 2015, foram registrados 1.761 casos suspeitos de microcefalia, em 422 municípios de 14 Estados. Foram notificados 19 óbitos de bebês com microcefalia e suspeita de infecção pelo zika vírus”.
O Brasil, para não variar, é retardatário: não deu conta do mosquito Aedes aegypti, que aqui aportou com os navios negreiros. Na década de 50, foi erradicado, mas retornou nos anos 80, com uma epidemia de dengue em Roraima; em 1986, no Rio de Janeiro e no Nordeste; em 1990, no Sudeste; e em 1998, uma pandemia, com mais de 500 mil casos!
Como não extirpamos os criatórios de Aedes aegypti, agora ele exibe todo o seu poder para além da dengue: zika e chikungunya. Todo mundo sabe que só se previnem tais doenças erradicando-se o mosquito! Sem choro e sem vela, é o dever de casa de todas as prefeituras do país! E ponto final!
O governo federal respondeu prontamente ao leite derramado, a epidemia do zika vírus: desde elaborar um protocolo emergencial de vigilância e resposta aos casos de microcefalia supostamente pela infecção do zika vírus, passando por definir Situação de Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional no país, até lançar, em 5 de dezembro, o Plano Nacional de Enfrentamento à Microcefalia – mobilização nacional para conter novos casos relacionados ao zika vírus, que consta de três eixos de ação: mobilização e combate ao mosquito; atendimento às pessoas; e desenvolvimento tecnológico, educação e pesquisa.
Até 7 de dezembro passado, o MS incluía como suspeita de microcefalia o Perímetro Cefálico (PC) de 33 cm, quando adotou a medida padrão da OMS, que é de 32 cm. As diretrizes nacionais para a epidemia de microcefalia estão dadas, resta esperar o protagonismo dos governos locais (governadores e prefeitos).
Não será fácil. Não é impossível, mas complexo, concretizar as diretrizes do MS para as grávidas, a quem o ministério recomenda o uso de repelente e de calças compridas nas áreas de risco. Há discordâncias.
Thomaz Gollop, geneticista, especialista em medicina fetal, ginecologista e obstetra, diz que “especialistas em reprodução assistida estão recomendando adiar as transferências de embriões até abril para reduzir a possível exposição de fetos ao zika vírus!” E arremata: “O que você faria se a sua irmã ou filha planejasse hoje uma gravidez? Eu, certamente, diria: não engravide agora de jeito nenhum”.
Manda a prudência que as mulheres não engravidem agora, embora não saibamos exatamente se o zika vírus é o causador da microcefalia, pois ainda é uma hipótese a se confirmar! Mesmo assim, o tributo maior é das mulheres: o adiamento do desejo de engravidar e a imolação diante da microcefalia. Camilla Costa, em “Mães de bebês com microcefalia enfrentam distância, cansaço e maratona de exames”, exibe o impacto do caos da peregrinação, ainda inicial, em “lombo de vans” (BBC, 7.12.2015). Descentralizar o atendimento é indicativo número 1 de humanização da atenção!
Cinthya Leite, em “Mães de bebês com microcefalia precisam de apoio psicossocial” (“JC”, 5.12.2015), afirma, com o que concordo, que o Brasil tem de cuidar de quem nasceu com microcefalia, incluindo as mães, já que está escrito na pedra, infelizmente, que “Quem pariu Mateus que o embale!”.
O que faremos com nossas crianças com microcefalia?
A minha experiência como médica em relação à doença neurológica microcefalia é nula. Quando estudei medicina na Universidade Federal do Maranhão, (1973 a 1978) não vi nenhum caso. A microcefalia é doença neurológica rara, incurável, que incide em um em cada 40 mil recém-nascidos, e o comprometimento vai de brando a severo, dependendo de como e quanto o cérebro foi lesado – o que é visto por tomografia! Por Fátima Oliveira, do
O Tempo O “tamanho” normal da cabeça de recém-nascido a termo é o Perímetro Cefálico (PC) entre 34 cm e 37 cm. A microcefalia é uma cabeça pequena com cérebro reduzido em bebê nascido a termo (“de tempo”), com PC igual ou menor que 33 cm – quanto menor o PC, mais lesões! A microcefalia resulta de “insuficiência no desenvolvimento do crânio e do encéfalo”, gerando dois tipos de doença: microcefalia primária (anomalia genética) e a secundária – decorrente de várias causas: defeito no desenvolvimento embrionário causado por infecções maternas durante a gravidez (rubéola, toxoplasmose); exposição a radiações ionizantes nos primeiros meses de gestação; e “por uma fusão prematura dos ossos do crânio (craniossinostose), de causa desconhecida, relacionada com outros defeitos congênitos ou doenças ósseas como o raquitismo”. Vi a primeira criança com microcefalia no pronto-socorro do Hospital das Clínicas da UFMG, onde trabalhei de 1996 a junho de 2014. Depois de ver várias crianças com microcefalia, a gente vai “endurecendo o couro”: não fica mais impactada, apenas compartilha o calvário da mãe que entrega sua vida aos cuidados específicos e especiais que a criança exige, depois de perder emprego e marido – que, em geral, não aguenta o tranco e some! O maior tributo da microcefalia é pago pelas mães. Estou assustada, incomodada e preocupada com os números de bebês com microcefalia divulgados pelo Ministério da Saúde (MS), a maioria nascida em lugares onde o habitual é morrer à míngua, pois tenho quase certeza de que não receberão atenção digna, tanto médica quanto social, a não ser que o governo federal assuma a total responsabilidade deles, pois as famílias não darão conta, e as prefeituras lavarão as mãos! Casos de microcefalia notificados no Brasil em 2010: 153; em 2011: 139; em 2012: 175; em 2013: 167; em 2014: 147; e, em 2015, até 21 de novembro, 739 casos “suspeitos” em 160 municípios de oito Estados do Nordeste e um do Centro-Oeste (Goiás)! Ocorreu um óbito no Rio Grande do Norte.
Pernambuco tem o maior número: 487 casos, conforme notificou ao MS, em 27 de outubro, a infectologista pediátrica Maria Angela Rocha, do Hospital Universitário Oswaldo Cruz, de Recife. O Maranhão não aparece nas duas notas do MS (17 e 24 de novembro). Em 16.11, o secretário de Estado da Saúde, o médico sanitarista Marcos Pacheco,
descartou um surto da doença, porém, dez dias depois,
comunicounotificação de dez casos (27.11.2015). O MS acionou o Grupo Estratégico Interministerial de Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional e Internacional e está investigando os casos. Suspeita-se que a causa seja o zika vírus, transmitido pelo Aedes aegypti, que também causa dengue e chikungunya. A confirmar. Há uma epidemia de zika em curso no Brasil desde o início de 2015, que havia atingido só a Polinésia Francesa e a Micronésia (Oceania). No dia 26 passado, a Polinésia Francesa declarou que, após a epidemia, ocorreram “casos de malformação cerebral e lesões cerebrais em fetos; e cinco crianças tiveram outros problemas, como dificuldade de engolir”. O Brasil deve assumir integralmente as crianças com microcefalia e suas mães.
Surto de microcefalia em bebês faz País decretar emergência sanitária nacional
Há ainda notificações no Rio Grande do Norte e Paraíba, mas em menores proporções. Uma das suspeitas é de que o aumento esteja relacionado com o zika vírus.
O Ministério da Saúde vai declarar nesta quarta-feira, 11, estado de emergência nacional em razão de um surto identificado em Pernambuco de nascimento de bebês com microcefalia, malformação que causa sérias deficiências de desenvolvimento. Até o momento, foram notificados 141 casos em 55 cidades – a maioria registrada a partir de outubro. O número é 15 vezes superior à média apresentada no período de 2010a 2014: 9 casos por ano. Há ainda notificações no Rio Grande do Norte e Paraíba, mas em menores proporções. Uma das suspeitas é de que o aumento esteja relacionado com o zika vírus.
“Não há registros de uma situação como essa na história recente”, descreveu o diretor do Departamento de Vigilância de Doenças Transmissíveis do ministério, Cláudio Maierovitch. A partir da decretação de emergência nacional, um grupo de especialistas será formado para investigar as causas do aumento tão significativo do número de casos. A intenção é dar mais agilidade na investigação do problema. O comitê executivo será formado por integrantes de institutos de pesquisa e pelo governo. Bebês com microcefalia nascem com perímetro cefálico menor do que a média. O problema pode ser provocado por uma série de fatores, desde desnutrição da mãe, abuso de drogas até infecções durante a gestação, como rubéola, toxoplasmose, citomegalovírus. Uma das hipóteses avaliadas pela equipe que investiga o surto é a contaminação da mãe pelo zika. Transmitido pelo
Aedes aegypti, o mesmo mosquito que provoca a dengue, o vírus causa uma reação que até agora era dada pouca importância nos adultos: febre baixa, coceiras, manchas vermelhas pelo corpo. A doença chegou ao Brasil neste ano e atingiu principalmente Estados do Nordeste. O aumento de casos de bebês com microcefalia coincide com período em que gestantes poderiam ter tido contato com o vírus. No início do ano, Pernambuco enfrentou uma epidemia de dengue e zika vírus. Foram contabilizadas 113.328 infecções no Estado, cinco vezes mais do que havia ocorrido em 2014. “É apenas uma das causas que serão investigadas. O fato de boa parte das mães apresentaram em comum as manchas pelo corpo durante os primeiros meses de gestação não permite tirar nenhuma conclusão”, contou o professor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e colaborador da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) Carlos Brito. O caso foi comunicado à Organização Pan Americana de Saúde e ao Ministério da Saúde. Há duas semanas, um grupo da Vigilância em Saúde está no local, para analisar as hipóteses. Mães e bebês estão sendo submetidos a exames, para identificar a presença de situações em comum que possam levar à origem do surto. Uma das maiores dificuldades enfrentadas pelas equipes é o fato de não existir um exame específico para o zika. O teste realizado para confirmação dos casos tenta encontrar traços do DNA do vírus. “O problema é que um eventual contato do bebê com algum vírus ocorre ainda durante a gestação. O resultado negativo para a pesquisa do vírus não necessariamente quer dizer que bebê e mãe não foram contaminados, são necessários testes sorológicos”, avalia Brito. No Rio Grande do Norte, até o início desta semana, haviam sido identificados 10 bebês nascidos com microcefalia. Há ainda outras 11 gestantes com bebês que já tiveram o diagnóstico da malformação. “Das gestantes analisadas, 70% apresentaram relatos de manchas pelo corpo, coceiras durante os primeiros meses da gestação”, disse o pesquisador Kleber Luz, da Fiocruz. Ele também investiga o aumento significativo do número de casos de nascimentos de bebês com o problema. “É preciso deixar claro que outras hipóteses têm de ser avaliadas. Estamos sendo muito cautelosos, mas não podemos descartar nenhuma hipótese.” Qualquer que seja a causa, o impacto para saúde pública e para famílias é grande. “Crianças que nascem com microcefalia têm de ser acompanhadas regularmente. Vão necessitar de fisioterapia, terapia ocupacional. Muitas podem ter problemas de visão, cognitivos, epilepsia”, explicou a neurologista infantil Adélia Henrique Souza, uma das primeiras a identificar o aumento do número de casos em Pernambuco. “Sempre atendi consultórios um ou outro caso. Mas não em tamanha magnitude.” Diante do aumento de casos, a Secretaria de Saúde de Pernambuco tornou obrigatória a notificação de casos de nascimento de bebês com microcefalia. Também foi lançado na segunda-feira, 9, um protocolo para detecção de casos, para atendimento e acompanhamento dos bebês. Nesta primeira etapa, o protocolo indica quais exames devem ser feitos em caso de suspeita do nascimento de bebês com problema e para onde devem ser encaminhados. Também será feito um manual para acompanhamento das gestantes e identificação do problema ainda durante o período da gestação. Serviços também serão desenvolvidos para atender os bebês.
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