Artigo
Especialista Diz Que É Possível Parar Com Os Testes Em Animais
Especialista diz que é possível parar com os testes em animais
Por
-
06/11/2013
Da Revista Galileu
Especialista em cardiologia nuclear e diretor do Comitê Médico Pela Medicina Responsável, John Pipp afirma que é possível parar com os testes agora
por Ana Freitas
O uso de animais em testes científicos e pesquisas acadêmicas poderia ser interrompido hoje mesmo sem nenhum ônus para o avanço científico: essa é a opinião do Dr. John Pippin, diretor de negócios acadêmicos da associação americana PCRM (Sigla em inglês para Comitê Médico Pela Medicina Responsável), sobre o uso de animais em pesquisas laboratoriais e acadêmicas.
O PCRM tem mais de 150 mil médicos e civis associados nos EUA e, desde 1985, defende uma medicina mais responsável e ética, e isso inclui a divulgação da importância da nutrição preventiva – em vez da prática de receitar drogas aos pacientes para corrigir problemas que poderiam ter sido evitados através de uma alimentação correta, por exemplo – e o fim do uso de animais em testes laboratoriais e pesquisas acadêmicas, entre outras coisas. De acordo com o PCRM, os resultados de testes com animais são tão imprecisos e incompatíveis com a maneira como o organismo humano reage que não faz sentido continuar submetendo os animais a eles. Para eles, não funciona, e se não funciona, não deveria estar sendo feito mesmo que não tivéssemos outras alternativas.
Em entrevista à GALILEU, John Pippin, especializado em cardiologia nuclear com mais de 70 artigos científicos dos, falou sobre a ineficiência desse tipo de teste, as possíveis alternativas e sobre o caso do Instituo Royal.
GALILEU: Qual é a sua opinião sobre o uso de animais em pesquisas acadêmicas e testes laboratoriais?
Minha posição é que é errado sob todos os aspectos. É errado por razões éticas, e eu posso dizer isso, com autoridade porque eu já participei de pesquisas que testavam em animais, então posso dizer que, mesmo nas mãos de pessoas que cuidadosas e carinhosas, é horrível, cruel, e muitas vezes fatal para os animais que são usados nesse tipo de pesquisa. Essa é a questão ética.
A questão científica é que está provado que o uso de animais para estudar doenças humanas e testar drogas para uso humano antes que eles sejam mandadas para teste clínicos em pessoas é um grande erro. Os resultados geralmente têm uma aplicabilidade muito baixa em seres humanos, e é um sistema que claramente está demonstrado que não é eficaz, não prevê os resultados em organismos humanos, consome grandes recursos financeiros e produz poucos, quando nenhum, benefícios para pacientes.
Do ponto de vista científico, é errado porque não funciona. E do ponto de vista moral, é errado porque é cruel e fatal para os animais nos laboratórios.
Então porque os testes ainda são largamente usados por pesquisadores?
Há três grandes razões pelas quais isso continua e elas são dinheiro, dinheiro e dinheiro.As pesquisas em animais para doenças humanas, ao menos nos EUA, acontecem em universidades e ambientes acadêmicos, e essa pesquisa é paga por dinheiro público. Esses institutos gastam todo ano cerca de 13 bilhões de dólares em pesquisas usando animais. Obviamente isso é muito dinheiro, muitas grandes universidades nos EUA – Harvard, Yale, entre outras – ganham muito dinheiro para conduzir essas pesquisas. E sem esse dinheiro, carreiras e construção de infra-estrutura estariam em perigo. Há grande resistência no uso de animais em pesquisa porque é lucrativo.
Por que o governo continua a colocar dinheiro em algo que não funciona?
Eles não concordam que não funciona: eles acham que as vezes funciona, ou às vezes não funciona e que se esperarmos o suficiente, coisas que não funcionam agora funcionarão no futuro. Isso é nonsense. No caso dos EUA, por exemplo, o povo está pagando por essas pesquisas merece ver resultados que beneficiem sua saúde e bem-estar, e isso não está acontecendo.
Outra razão pela qual o governo continua a gastar dinheiro nisso é que as pessoas que tomam essas decisões são, eles mesmos, pesquisadores que usam animais nos testes, gente que acredita nisso. É por isso que pesquisa animal para doenças humanas continua.
Ativistas contra testes em animais (Foto: David Navalha/Flickr/Creative Commons)
E na indústria farmacêutica? Se o senhor afirma que esses testes são ineficientes para prever resultados em organismos humanos, por que eles continuam sendo feitos?
As empresas farmacêuticas estão interessadas em apenas uma coisa: ter os remédios aprovados pelo FDA (Foods and Drugs Administration, a vigilância sanitária dos EUA) para que sejam usados em humanos. A maneira mais fácil de fazer isso é dar ao FDA resultados de pesquisas com animais, porque o FDA está acostumado a ver resultados baseados nesse tipo de pesquisa, e é através de testes em animais que eles frequentemente aprovam testes em humanos.
E apesar disso, o próprio FDA já admitiu que testes em animais não são capazes de prever o comportamento do organismo humano diante de uma droga. 92% de todas as drogas testadas com sucesso em animais, e depois em humanos, falham de alguma forma[fonte]. Isso não é ciência, é bruxaria. Não deveria ser financiada e apoiado pela FDA, é uma fraude, e uma fraude que acontece por causa de dinheiro. Companhias farmacêuticas estão entre as maiores dos EUA, as mais ricas. O frustrante é que o FDA sabe que não faz sentido.
E quais são as alternativas mais eficientes ao teste com animais?
O princípio fundamental de achar alternativas melhores à política falida de usar animais é usar um sistema que se aplique a humanos.
Usando tecidos humanos, você consegue resultados que se aplicam a humanos, e você não precisa adivinhar se o que aconteceu com o rato também se aplica a humanos. É possível usar um tecido do fígado, colocar em contato com uma droga pra ver se vai causar algum câncer. Há vários tipos de tecidos possíveis, mas as amostras mais avançadas são ambientes tridimensionais, como partes de cânceres ou partes de tecido humano. E a área mais promissora nesse sentido é a de células tronco.
Hoje é possível obter células tronco que podem ser programadas para se tornar qualquer tecido que você queira a partir de outros tecidos. Dá pra criar corações, fígados, pulmões. Já foram criadas bexigas humanas a partir de células tronco. Isso mostra o potencial de usá-las para estudar o efeito de drogas e químicos em tecidos humanos. Há também métodos baseados em software: são vastos bancos de dados armazenando informações sobre o comportamento do organismo humano em geral e o que se observou até hoje que funciona e não funciona. É possível observar como uma droga influencia nos genes de alguém e pode vir a causar uma doença no futuro, ou como certos genes podem gerar uma pré-disposição para algumas doenças caso interajam com drogas. Empresas farmacêuticas já usam isso, porque eles sabem que funciona. Mas eles também usam testes em animais porque é isso que o FDA está acostumado a receber.
Se eu entendi bem, sua opinião então é que, se não funciona, não deveríamos nem nos preocupar em substituir o processo atual com alternativas, mas sim parar completamente?
Exatamente. Quando as pessoas me perguntam “mas se não usarmos animais, o que vamos fazer? Temos que fazer algo, não podemos dar remédios pras pessoas sem testá-los”, minha resposta é “Olha, se não funciona, consome seus recursos, usa dinheiro do contribuinte e prejudica as pessoas, como drogas como o Vioxx fizeram [Vioxx foi um anti-inflamatório testado com resultados inócuos em animais, mas que depois, no mercado, chegava a triplicar o risco de morte por ataque cardíaco nos pacientes. Foi retirado de circulação nos EUA em 2004], então temos de parar!
Mesmo que não façamos nada alternativo, vamos parar. Não está funcionando”. E aí eu digo que, poxa, ainda por cima há sim alternativas se a gente quiser usá-las.
Você ouviu falar do caso do caso do laboratório brasileiro que foi invadido por ativistas?
Dos beagles, não é? Sim, esse caso foi bastante repercutido nos EUA. Me entristece que as pessoas sejam obrigadas a agir fora da lei para fazer aquilo que acham que é certo. Essas pessoas são corajosas. Elas estão se arriscando por algo que sabem que é justo e não têm ninguém para protegê-las. Os beagles têm gente como elas.
Em quanto tempo você acha que os EUA vão parar de fazer testes em animais?
Acho que passamos do ponto em que pessoas discutem se pesquisas animais são abordagens científicas confiáveis. Todo mundo entende que não é. Gente como eu entende que essas pesquisas não têm valor nenhum, e outras pessoas da área acham que a abordagem é falha mas que de vez em quando ela traz alguns resultados úteis, e portanto têm que continuar fazendo.
Já passamos da parte em que provamos que testar em animais não é certo. Já estamos no caminho em direção a achar maneiras melhores de fazer isso Porque essa indústria não tem ética e só se preocupa com votos e dinheiro, eu diria 10 a 15 anos. E isso é porque demora um tempo até convencer a FDA que eles estão fazendo algo errado, mesmo com o comitê de ciência e o congresso dizendo que eles estão fazendo tudo errado.
Fonte: https://jornalggn.com.br/saude/especialista-diz-que-e-possivel-parar-com-os-testes-em-animais/
ALTERNATIVAS A TESTES
Utilizar o termo “alternativa” a testes com animais não seria apropriado, pois parte do pressuposto que utilizar animais é o modo correto de se chegar a um determinado resultado para seres humanos, e isso não é verdade. No entanto, o uso do termo é comumente empregado quando se refere a testes sem a utilização de animais. Vale lembrar que a experimentação animal nunca foi “validada”. Ela foi simplesmente aceita por ser o método gerador de dados utilizado tradicionalmente e sua precisão e efetividade nunca foram cientificamente colocadas à prova.
Antes de lançar um produto, os fabricantes devem estabelecer parâmetros para a segurança das pessoas que entrarão em contato com ele. Existem muitas maneiras de testar os efeitos tóxicos de uma substância sem utilizar animais.
As agências oficiais que regulamentam esses parâmetros (na Europa e Estados Unidos) estão começando a aceitar e promover alternativas que passaram por testes rigorosos de validação e indicaram consistência nos resultados. Ao contrário, os testes de segurança baseados em animais nunca passariam nos níveis de exigência necessários para validar os novos métodos in vitro. Essa perspectiva levou a uma maior ênfase na importância de novas técnicas como fonte de descoberta e progresso científicos.
As alternativas que foram ou estão em processo de validação avaliam: toxicidade crônica, reprodutiva, aguda e de desenvolvimento; irritação ocular e dérmica; hipersensibilidade; mutagenicidade/carcinogenicidade/ fototoxicidade; respostas comportamentais.
EXEMPLOS DE ALTERNATIVAS
O Instituto Nacional do Câncer, nos Estados Unidos, adotou um filtro inicial anti-câncer in vitro para compostos, automaticamente substituindo mais de um milhão de camundongos por ano.
Episkin – epiderme humana reconstituída in vitro para avaliação de corrosividade para cosméticos e componentes químicos.
Corrositex – um sistema de dupla câmara com membrana de colágeno. A cor (PH) muda quando o químico em teste penetra no indicador da câmara (amplamente usado nos Estados Unidos e Europa para testar corrosividade).
Relação química de estrutura-atividade computadorizada (SAR) e sistemas de base de dados especializados permitem que se preveja a eficácia e a segurança/toxicidade de novos compostos.
Epiocular- tecido de diversas camadas, reproduzível, derivado de células humanas para testar irritação ocular de químicos e outros materiais.
EpiAirway- é uma cultura tridimensional de células epiteliais traqueo-bronquiais humanas para estudos pré-clínicos de drogas inalatórias.
Epiderm- é um tecido reproduzível, tridimensional, derivado de células epiteliais humanas para estudos de irritantes e corrosivos.
O teste Ames utiliza classes específicas de bactérias comuns para detetar mudanças genéticas causadas pelas substâncias em teste – possibilidades de mutagênese e carcinogênese.
A Toxicogenômica utiliza chips de DNA para identificar padrões de mudanças genéticas característicos de endpoints de toxicidade específicos. Irá substituir praticamente todos os testes baseados em animais.