A fonte pode ser nuclear, hidrelétrica ou até bagaço de cana. Os países estão descobrindo que não há alternativa sem custo ambiental
Bruno Ferrari, de Berlim
ESCOLHAS
Protestos contra a energia nuclear na Alemanha e usina de cana no Brasil. Fontes potenciais de energia que não poluem a atmosfera
A discussão sobre o risco de manter usinas nucleares como fonte de energia está encerrada na Alemanha. Na semana passada, uma coalizão dos três principais partidos alemães, sob o comando da chanceler Angela Merkel, decidiu que, até 2022, o país não usará energia nuclear. O debate sobre os riscos à segurança é antigo na Alemanha, mas ganhou uma repercussão inédita depois do acidente com a usina de Fukushima, no Japão. A medida atende aos anseios de boa parte da população. No dia 28 de maio, milhares de pessoas se reuniram em Berlim contra as usinas nucleares. Mesmo popular, a decisão tem um preço ambiental. Em um país com poucas opções energéticas como a Alemanha, desligar os reatores deve significar queimar mais carvão e gás natural nas usinas termelétricas do país. Isso aumentaria as emissões dos gases responsáveis pelas mudanças climáticas, a maior ameaça ecológica de hoje.
O dilema alemão mostra como é complexa a busca por energia em um mundo que consome cada vez mais, e enfrenta constrangimentos ambientais. Não existem soluções ideais. Nem entre as fontes consideradas mais limpas. Usinas hidrelétricas enfrentam resistências ambientais por seus impactos nos rios e nas florestas. A energia solar ainda depende de subsídios. As usinas eólicas usam grandes áreas e podem afetar aves migratórias. Diante da ameaça do clima, os países terão de, em alguns casos, assumir algum sacrifício ambiental. E, na falta de uma solução perfeita, distribuir a geração de energia em várias fontes diferentes. “Assim você dilui o impacto de todas elas”, diz o alemão Mario Tobias, secretário-geral do Instituto para Estudos Avançados de Sustentabilidade, sediado na cidade de Potsdam.
O Brasil está em uma posição mais confortável do que a maioria dos países do mundo. Mas não fica isento de decisões difíceis. A mais debatida delas hoje é a usina hidrelétrica de Belo Monte. Na semana passada, o Ibama autorizou a construção da hidrelétrica, apesar das críticas dos ambientalistas. Por um lado, a usina produz energia com baixas emissões poluentes. Em compensação, ela vai alterar o curso do rio e poderá alimentar o desmatamento na região. Essa derrubada da floresta é a principal contribuição brasileira para o aquecimento global. Para alguns especialistas, qualquer grande obra gera alterações ambientais. “Há impacto na instalação de qualquer usina energética”, afirma o físico Luiz Pinguelli Rosa, diretor da pós-graduação em engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro. “Mas construir uma barragem é melhor do que queimar carvão ou gás. No Brasil, há uma burrice endêmica contra a hidrelétrica.”
Uma alternativa para o país é aproveitar melhor o potencial das usinas de cana para também gerar eletricidade. Elas podem queimar a palha e o bagaço da cana, geralmente usados para cobrir o solo ou produzir adubo. Se usadas para gerar energia, essas fontes orgânicas não contribuem para o aquecimento global. Isso porque o gás carbônico emitido pela queima da palha e do bagaço é compensado pelo que a planta retira do ar enquanto cresce. É a mesma lógica que se faz do etanol dos carros, também derivado da cana, um combustível que não contribui para o aquecimento global.
Um novo estudo feito pela União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Única) mostra que apenas 100 das 438 usinas de cana brasileiras produzem também energia elétrica. Segundo o presidente da entidade, Marcos Jank, se todo o potencial energético ocioso do setor fosse explorado, as usinas gerariam, até 2015, um adicional de energia ao país equivalente a uma nova Itaipu. “Em 2020, poderíamos produzir o equivalente a três Belo Montes”, afirma Jank. Atualmente, a eletricidade da cana é responsável por 2% da produção brasileira. Se recebesse mais investimentos, essa participação passaria a 15% ao final da década. O desafio é estimular a expansão da cana sem incentivar novos desmatamentos para o cultivo em remanescentes de cerrado, como em Goiás e em Mato Grosso do Sul. As áreas disponíveis para aumentar os canaviais estão se esgotando. O Brasil, assim como o planeta, ficou pequeno.
Todos os direitos reservados:
http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EMI238595-15228,00.html