Artigo
Novos Planetas Em Órbita À Volta Da Internet.
SOMOS NOVOS PLANETAS EM ÓRBITA À VOLTA DA INTERNET
Minúsculos aparelhos tecnológicos, tão úteis quanto nefastos, sequestram-nos do mundo real e geram um novo sistema planetário, com vida mas dominado por inexistência, com inverdades e pretensões de um perfeccionismo que banaliza o real. Será que as redes sociais realmente socializam? Já foi dispendioso comunicar-se a distância, pior se isso envolvesse travessias a oceanos. Houve tempos em que uma caixa telefónica, posicionada em local estratégico da casa, era praticamente o único recurso de que dispúnhamos para trocar dizeres com quem estivesse em outro local. Privacidade dependia da sorte e como era impossível prever quem levantaria o auscultador do outro lado da linha, eram indispensáveis as boas maneiras e o respeito na comunicação. Mas, os tempos mudam, alcançando à velocidade estonteante, novos momentos, novos hábitos, novos modelos de ser-se comunicativo. Estamos numa era onde a tecnologia encontra-se sempre um passo mais à frente que a nossa habilidade de utilizá-la. Com um smartphone e alguns clic's temos aplicativos mágicos para comunicar. Comunicar agora e em privado! Comunicar já e com todos! Hoje, temos a disposição, autênticos motores das chamadas redes sociais, que denunciam apego e inventam hábitos robóticos, sobretudo na juventude. Estes "comunicadores instantâneos", são tão poderosos que promovem "imediatismo e insocialização". Famílias encontram um substituto a interacções que envolvem olhares, sorrisos, tons de voz, manifestações corporais, o delicioso toque na pele e aquelas palavras que se soltam ao mesmo tempo seguidas de risada, por frases ditas aos polegares, muitas vezes atropelando o legado de Camões e esboçando falsa emoção através dos Emoji ????. Os espaços sociais da casa já não são mais necessários. A sala de estar só se mais ninguém lá estiver, a cozinha só se a refeição for mesmo rápida. O quarto, este sim, é um território ultra-privado dentro do qual nos aprisionamos e virtualmente encontramo-nos com o mundo. Caso aconteça aquele passeio familiar, quanto menos conversas melhor. Cada um preso a sua tela pretendendo ausência, fingindo comunicação com alguém distante e impondo distância a quem está presente. Vivemos como que envoltos de forma individual em bolhas de sabão que levitam em órbita a volta de um novo sol: a internet. Um sol frio e sem luz mas viciante e tão benéfico quanto prejudicial. É neste novo sistema planetário onde novos idiomas ganham espaço, encorpados de comunicação falsa, emoções desenhadas, mensagens vagas e declarações até com sentimento mas desprovidas de sensação. De que vale ter a luz do sol e nunca sentir o seu calor? Por detrás do visor cada um adopta um sem número de personagens como forma de inventar uma imagem de si próprio que se pretende real mas realmente desajustada. Ser verdadeiro parece tabú. No facebook e no instagram -se o que gostávamos que fosse verdade, o acima do real, o perfeito, como se o ser humano fosse dotado do tal poder da perfeição. Todos pretendendo agir como astros da música e do cinema, exibindo viagens, lugares, carros, roupas, comidas e bebidas, talento inexistente, beleza do Photoshop e sorriso decorado para a foto. Todos anseiam audiência, os venerados likes, nem que para isso caiam no ridículo ou cheguem a nudez do corpo, denunciando o vazio que mora dentro de si mesmos. Este lado obscuro dessas ferramentas tecnológicas cresce desenfreadamente, sobrepondo-se a valores sociais e aos imensuráveis benefícios que elas poderiam trazer. Não deixa de ser uma bênção a nossa, a de existirmos numa era onde a informação não pára de chegar, apesar de fazer-se sorte para uns e azares para consumidores de paladares menos refinados. Enquanto uns evoluem, outros "mediocretizam-se". Porquê inventar o que não somos? Porquê essa mania de não reconhecermos proximidade? Porquê criar distâncias mesmo quando estamos uns ao lado dos outros? Porquê fingir estar ausentes quando estamos aqui? Estas tecnologias foram criadas para eliminar o longe e tornar perene o perto. Não foram inventadas para reinventar distâncias, para esconder nossa personalidade, tampouco para nos tornar anti-sociais. Foram criadas para que mesmo distantes estejamos perto e quando perto, estejamos realmente uns com os outros. Quando estamos juntos, um celular pode registar nossas interacções proibidas pelo longe mas, quando estamos distantes, ele nos aproxima, nos une, torna-se a nossa rede social. A vida é aqui do outro lado da câmera e dessa telinha reluzente, onde nem sempre temos chances de escolher a fotografia ou de digitar o mesmo evento duas vezes, impondo-se aceitar que enquanto vivos existem dúvidas e certezas, medos e coragem, escolhas e imposições, prazeres e dores, paz e lutas, sorrisos e choros, aceitação e descriminação, preferências e rejeições, riqueza e pobreza, sucesso e fracasso. A vida tem sim o lado bom e o lado ruim, o lado belo e o menos belo. Apesar de tudo, lutar contra a tecnologia seria uma forma de aversão a evolução e ao futuro. Não temos escolha. Não nos sobra tempo para "futurofobia". Temos que aceitar este futuro tecnológico que é uma certeza. Cabe-nos, readaptar nossas formas de estar, integrando estes dispositivos mágicos em nossas vidas, de forma inteligente, equilibrada e benéfica. As redes sociais podem ser vistas como instrumentos de eliminação do ausente, de comunicação franca, de valorização do presente, de promoção da educação e uma contribuição tecnológica para o enriquecimento de interações sociais reais. TODOS OS DIREITOS RESERVADOS AO SITE:© obvious: http://obviousmag.org/evidence/2016/somos-novos-planetas-em-orbita-a-volta-da-internet.html#ixzz4255k6MmC Follow us: @obvious on Twitter | obviousmagazine on Facebook