A melhor
roupa, o celular de última
tecnologia, o
brinquedo mais caro, o último
videogame lançado. Quando o assunto é infância e adolescência, o
consumismo e a
dade abusiva direcionada às
crianças de até 12 anos tem se tornado uma questão discutida frequentemente. A aprovação da
resolução 163, emitida pelo
Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente) no primeiro semestre de 2014,
proíbe qualquer dade - considerada abusiva - dirigida às crianças com a intenção de protegê-las da
persuasão ao consumo. Stalimir Vieira, especialista em
dade infantil da
Associação Brasileira de Agências de Publicidade (ABAP), é
contra a resolução, e acredita que já que vivemos em um sistema que se sustenta, economicamente, no consumo, "
não será alienando as crianças a respeito da informação comercial de produtos dirigidos a elas que vamos contribuir com o
desenvolvimento de seu discernimento". Leia a entrevista completa abaixo:
Brasil Post: As crianças são consideradas sensíveis e vulneráveis à dade, por isso, a propaganda para esse público deve ser regulada cuidadosamente. A dade deve ser proibida para crianças? Stalimir Vieira: Regulada cuidadosamente, sim; proibida, não. Alienar as crianças desse processo com o propósito de protegê-las é contraditório, pois a sociedade em que elas vão crescer e construir sua independência econômica é a sociedade capitalista, sustentada pelo consumo.
A nova resolução proíbe qualquer tipo de merchandising direcionado às crianças. Privá-las deste tipo de conteúdo não seria uma medida extremamente ‘radical e reducionista’? Acho que algumas restrições são necessárias para evitar abusos. E o que são abusos? Tentativas de enganar a criança com relação à explicitude da peça tária, por exemplo. Além das questões relativas à propriedade da linguagem utilizada. Quando se tratam de crianças, o ideal é que a mensagem contribua com a formação de valores positivos. E isso é absolutamente compatível com a dade. Dá para imaginar qual seria a ‘propaganda ideal’ para uma criança É aquele que se faz interessante para ela sem abusar da sua credulidade. É aquela que vende a marca para ela sem falsas promessas nem qualquer tipo de discriminação. E é aquela que, idealmente, ajude a educá-la positivamente.
Por que é preciso proibir ao invés de regulamentar? Só seria preciso proibir se não houvesse já toda sorte de proteção à criança. Começando pela Constituição Federal, passando pelo Código de Defesa do Consumidor e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente até chegarmos ao CONAR (Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária), com um longo capítulo exatamente sobre as restrições à dade dirigida às crianças. Além disso, se dermos uma olhada atenta às mudanças ocorridas nos últimos vinte anos, vamos perceber um passo gigantesco na conscientização sobre as diferenças de tratamento a serem cumpridas nas mensagens. Portanto, a proibição é um grande retrocesso num processo que vem evoluindo, democraticamente, já faz tempo.
Inspecionar com rigidez o que é feito e dirigido a este tipo de público não seria o melhor caminho? Sem dúvida, a fiscalização para que se cumpra a regulamentação existente é muito necessária. Aliás, o próprio consumidor tem sido muito proativo nesse sentido. Sempre que ocorrem abusos há um clamor popular que é extremante danoso para as marcas. Não há punição maior do que a crítica pública, ainda mais agora com o protagonismo das redes sociais. Então, ficar buscando proibição em épocas em que tudo se expõe com tanta transparência, para o bem ou para o mal, me parece que é andar para trás na história.
A discussão é complexa e dá até para questionar o comportamento dos pais neste quesito e da sociedade como um todo, já que, ao proibir, mais uma vez, é passada a responsabilidade de ‘criar os filhos’ dos pais para o Estado. Você concorda? O correto é os filhos serem educados pelos pais. O contrário é terceirizar a educação para grupos que pensam de uma determinada maneira e que tentam impor o seu ponto de vista, através de atitudes obscurantistas. Acho que nossas crianças precisam ser estimuladas a desenvolverem um senso crítico a toda informação que receberem. Ou seja, ver, ouvir e questionar as mensagens. Isso é o oposto de silenciar as mensagens.
Até que ponto é possível educar, explicar o que é melhor, pior, pode, não pode, se as crianças não terão acesso a determinados conteúdos e informações? Esta é a questão. Não será alienando as crianças a respeito da informação comercial de produtos dirigidos a elas que vamos contribuir com o desenvolvimento de seu discernimento. É preciso que pais e filhos estejam sujeitos às informações e, assim, tenham a oportunidade de tratar delas, levantar questões, criticar, elogiar e aprender a fazer escolhas. Às vezes, me parece que esse fato é o que mais incomoda a militância pela proibição. Ela parece não ser partidária do direito de escolha.
Por Andréa Martinelli Favoritar [email protected]